Reflexões de um ativista -- Parte 01
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Nesse último fim de semana, durante os dias 20 e 21 de Setembro (sexta-feira e sábado, respectivamente), ocorreram dois eventos sobre Software Livre na UNICAMP. Um deles, o Upstream, foi um “evento teste” que ajudei a organizar junto com o Cascardo e o Leonardo Garcia, ambos do LTC/IBM. O outro, o Software Freedom Day (SFD), eu organizei em nome do LibrePlanet São Paulo. Durante os dois eventos (e principalmente durante o SFD) eu fiquei pensando e refletindo bastante sobre vários assuntos relacionados (ou não) com o Software Livre. Resolvi, então, aproveitar a oportunidade e escrever um pouco sobre essas opiniões.
Antes, um breve relato dos dois eventos. Gostei parcialmente do resultado que obtivemos com o Upstream. Acho que a qualidade dos palestrantes foi ótima, e as discussões tiveram um nível muito bom. No entanto, os workshops deixaram a desejar. Pelo pouco que pensei a respeito, cheguei à conclusão de que faltou organização para definirmos os assuntos que iriam ser abordados, e principalmente o melhor modo de abordá-los. Assumo minha parcela de culpa nisso, afinal eu tentei ajudar na organização do workshop de toolchain e ele não saiu do modo como esperávamos. Problemas na infra-estrutura do local também atrapalharam no resultado final. Mas, de modo geral, e levando em conta que essa foi a primeira edição do evento, acho que conseguimos nos sair razoavelmente bem. Certamente já temos muitas coisas pra pensar e melhorar para a próxima edição!
Já sobre o SFD, apesar de várias pessoas muito boas terem participado do evento, a minha impressão inicial (e forte) foi a de que fazer a sociedade se interessar (ou ao menos ouvir, se bem que os dois conceitos são intrinsecamente ligados) por assuntos que são de suma importância para a manutenção (ou, no caso, a restauração) de um Estado que a respeite é mais difícil do que eu pensava. E essa é também a primeira reflexão do post.
Indignação x Ignorância
Há um conflito muito grande acontecendo com as pessoas. Provavelmente ele não é “de hoje”, mas de qualquer modo ele existe e precisa ser resolvido. O conflito, do modo que vejo, pode ser resumido da seguinte forma: “até que ponto eu quero sentir indignação sobre um assunto, de modo que eu não precise necessariamente tomar alguma atitude sobre ele?”. Ou seja, a pessoa opta voluntariamente por permanecer na ignorância parcial, para que ela não se sinta obrigada a tomar uma posição sobre determinado problema que a atinge.
Tomemos o exemplo do Facebook. Alguém que tenha uma conta lá (i.e., “quase todo mundo”) prefere se manter na ignorância sobre os termos de serviço e privacidade que o site possui. Não estou entrando no mérito de operações clandestinas de espionagem; estou falando sobre os textos disponíveis no site do Facebook e que explicam (talvez não de maneira muito clara, mas isso já é outro problema) o que o site faz e não faz a respeito dos seus dados. É uma opção. É mais fácil apenas usar o site, compartilhar imagens engraçadas com seus mil “amigos”, e não olhar para uma questão que deveria ser muito mais importante do que qualquer “like” que possa ser dado.
Não sou sociólogo e estou longe de poder dar opiniões acadêmicas sobre esse assunto, mas tenho a impressão de que o que acontece é um “retardo social” na maioria dos cidadãos deste planeta. Não deixa de ser um paradoxo o fato de que esse comportamento é exacerbado através de uma “rede social”, que se traveste de facilitadora de comunicações entre indivíduos para poder exercer a derradeira função de uma empresa: ganhar dinheiro. É importante frisar que não sou contra “ganhar dinheiro”, mas sou contra vários meios que são usados pra atingir esse objetivo.
No final, o produto somos nós, ou nossa privacidade. E quando eu digo “nós” ao invés de “eles”, é porque eu fiz uma outra reflexão…
Privacidade é um “bem” coletivo
Pode parecer paradoxal à primeira vista, mas pare e pense um pouco. A privacidade é sim um direito do indivíduo, mas quando você opta por não tê-la, você está fazendo essa opção em nome de todas as pessoas que se comunicam com você. Afinal, se você não se importa se alguém está lendo suas mensagens, então qualquer tipo de comunicação que chega até você pode e vai ser lida. E se essa comunicação partir de alguém que preza pela própria privacidade, não vai fazer diferença alguma: a mensagem será lida de qualquer jeito, porque você escolheu isso.
Estou acostumado a ouvir pessoas dizerem que elas não são tão importantes a ponto de despertarem interesse em algum governo para que ele queira espioná-las. “Portanto”, dizem as pessoas, “não preciso me preocupar”. Bem, acho que esse argumento não invalida de maneira alguma o fato de que proteger a própria privacidade é importante. Não interessa o quão público alguém é; se ele não preza pela sua privacidade, ele está abrindo mão de algo que afeta direta ou indiretamente várias pessoas.
O meu ponto aqui é simples. Faça a sua parte e proteja a sua privacidade. Ninguém vai fazer isso por você, mas todos precisam e podem fazer suas respectivas partes. É um trabalho em conjunto, mas que depende da cooperação de todos. Se alguém perto de você não se importar, você provavelmente vai ser prejudicado.